15 de fevereiro de 2022

Nem só de likes vive uma escritora

Costumo conversar muito com outras escritoras e nossos papos sempre chegam a uma questão delicada: como é difícil viver de literatura.

Além da vergonha de publicar e do medo do julgamento, há uma questão muito prática: vender livros não dá dinheiro para as autoras. Os 10% de direitos autorais que cedemos às editoras (quando elas pagam) não cobrem a nossa sobrevivência. Na maioria das vezes, ao invés de ganhar, a gente paga pra publicar (ilustrações, revisão gramatical, leitura crítica, etc.). Não acreditem nessas coachs de literatura que afirmam que é possível publicar algo sem custo algum e, muito menos, sem tempo. É má-fé, enganação, mas isso é um papo pra um texto futuro.

Hoje quero falar que nem só de curtidas vive uma escritora.

 

Viver de escrita não é o mesmo que viver de literatura

Acredite, os boletos também chegam pra gente. Muitas escritoras, precisam trabalhar em outras funções para poderem ter uma renda digna. Viver de escrita no Brasil, envolve fazer muitas coisas além de escrever.

Quando alguém diz que “vive de escrita”, isso significa que além de escrever seus livros, ela trabalha em outra coisa: ghost writer, copywriter (textos para marcas famosas e/ou empresas), revisora, preparadora e leitora crítica de textos. Ela pode também dar cursos, escrever projetos pra editais, vender os próprios livros na boca a boca, investir em outras artes como pintura, colagem, etc..

Muitas conciliam esses trabalhos com a vida acadêmica como eu.

Além de tudo isso, ainda existe a ideia de que arte não é trabalho. Sabe aquela revista ou blog que pede textos pra “te divulgar” mas não oferece um cachê mínimo que seja? Pois é. Qualquer manifestação artística requer investimento em tempo, energia, material de trabalho, etc.. A melhor forma de você divulgar e valorizar uma artista é pagando pela obra/trabalho dela.

Há também outro consenso: escritoras que produzem na região Norte e Nordeste do Brasil são, salvo raras exceções, invisíveis para o mercado editorial do sul-sudeste. E nós sabemos que lá é onde o status, o dinheiro e as maiores oportunidades circulam.

Por qual tipo de arte você está disposto a pagar?

A pandemia da Covid 19 mostrou que sem arte estaríamos perdidas. O consumo de livros, streamings de filmes e músicas aumentou muito durante o isolamento. Se você paga Netflix e o Spotify, por exemplo, por que não apoiar financeiramente as escritoras que você gosta de ler?

Precisamos desromantizar a ideia de que artista só faz arte por amor.  Nós temos nossas urgências. Sermos remuneradas pelo nosso trabalho é justo. Promove dignidade e auto estima.

Então, pensa aqui comigo. Quantos financiamentos coletivos você apoiou recentemente? Quantos livros de escritoras independentes? Ou você é aquela pessoa que diz que gosta de literatura só porque paga por uma assinatura caríssima de um clube de leitura e seus mimos instagramáveis?