A poesia de Laís Ferreira
Laís Ferreira Oliveira nasceu em 1992, em Belo Horizonte. É mestranda em Comunicação na UFF, com ênfase em estudos do cinema e audiovisual. É bacharela em Comunicação Social, pela UFMG. Em 2015, publicou o seu primeiro livro de poemas, Caderno de Bolsa, pela Chiado Editora. Em 2014, foi finalista do Concurso Nacional Novos Poetas, da Vivara Editora, com o poema “O Beco número 2”. Em 2008, obteve menção honrosa com a crônica Frutinhos e tiras de chitão no concurso “Brasileiros em Prosa & Verso” da editora Alba. Obteve o quinto lugar com o poema Outeiros nesse concurso. É crítica de cinema na Revista Moventes.
A pesca
Ontem um professor me disse
que só 2 entre 10 pescadores
sabem e se arriscam a nadar.
Como uma espécie solene
de respeito, os corpos atentos
apreenderam a gravidade nula
do que lhes sustenta. O berço
próprio da vida, onde mergulhar
seria arranhar a membrana. nBeber
do sangue que corre nas veias,
sorver das vigas que sustentam
a casa, o sonho, a persistência.
Nesta beira, há algo próximo
à matéria do amor. Deste lado,
a imagem cuidadosa é cristalina,
um instrumento que agora penteia,
reflete e trança os cabelos.
Submergir, porém, talharia finas
assinaturas, datas, dois pedidos
em que não mais se veria a manhã
com esta luz que nos envolve
sem que seja necessário fogo,
casca, poeira ou outro artifício.
A matéria do amor se apresenta
como as redes, as iscas, as buscas
próximas ao mar. Estas mãos
apenas seguem nos bolsos e veem
sal e ondas no cultivo do outro.
*
Baía
Os barcos, não os impetuosos
esses a dizer navegar é preciso,
estes aqui submersos divididos
neste teto assoreado onde
apenas se veem fragmentos
do espaço onde havia bússola,
alguém comentava do enjoo
outro pescava em silêncio.
Agora, uma gaivota caminha
não à procura de alimento, claro,
mas como o perdão misericórdia
necessários à despedida e à paz.
No cemitério dos barcos mortos,
ninguém vela, traz flores, chora.
Há apenas destroços que camuflam
sal e esquecimento na Guanabara.
*
Breve será dezembro
Em breve, completaremos uma semana
desde que decidimos este namoro.
Com os olhos de fora, pouco mudou.
Ainda descasco laranjas, parto-as
e, ao separar a tampa, eu engulo
as duas partes deste fruto em dois.
Ainda agora, eu também carrego
as sacolas, os pesos, os embrulhos,
como se enganchassem nos dedos,
nestas mãos que, próximas ao sol,
parecem não poder muito além
do trabalho, da persistência, do pó.
Pelos olhos de dentro, porém, vejo
esta laranja que não me alimenta
sozinha. Esta fruta agora se divide,
e estas mãos tecem silenciosamente
formas de contato invisíveis ao verbo.
Aqui se colocam ligeiras, entregues,
imaginam planetas, contam histórias,
colocam-se à espreita de um mundo
mais amplo e vivo que o mundo.
Nossos signos são desconhecidos:
é preciso inventar este contato,
esta maravilha de descansar junto,
ainda que este corpo doa. As costas
curvadas por se sustentarem aqui,
estes ombros por não acolherem
senão as alças e mangas das roupas
com as quais persistimos nestas ilhas.
Nenhum barco nos cruza os portos:
nosso mar pertence aos estrangeiros
ao visitarem o que não os pertence.
***
Poemas retirados do livro ao norte, ao chão, publicado em 2017, pela Editora Moinhos.
Você pode comprar aqui.
Título: Ao norte, ao chão
Autor: Laís Ferreira
Dimensões: 14 x 21 cm
Páginas: 56
Gênero: Poesia
Ano: 2017
ISBN: 978-85-92579-50-0
Edição: 1ª