2 de outubro de 2015

Quando eu li Alberto Caeiro

 

Desde o primeiro momento em que li Alberto Caeiro, tive a lúcida sensação que a literatura deveria ser feita e estruturada dessa forma como estava expressada na poesia. O mundo, a natureza como o são. Nada de filosofias esquivas, literaturas excessivas, pensamentos em demasia para nos dizer como a existência deve ser encarada, vivida, saboreada, explorada.

Se me refiro ao autor dessa forma, foi por causa desse impacto; ou melhor, não houve impacto, violência, sacudidela alguma. Percebi que tudo era pensado, filosofado demais, que a essência de tudo estava perdida, nublada, confusa. Caeiro diz que basta apenas olhar, sem pensar. Uma flor é uma flor, apenas isso. Ela não representa a beleza da natureza: ela representa apenas a si e isso basta.

A poesia trouxe simplicidade à minha vida. Trouxe, consequentemente, tranquilidade para apreciar a beleza das coisas sem procurar inúmeros e vazios significados que nada dizem. Voltei a olhar o mundo de maneira direta, clara, objetiva, desprovido de misticismo. O escritor não é um ser iluminado, diferente de ninguém. Tudo é nítido como um girassol. O menino Jesus apareceu como uma criança rolando na erva. Se isso não for sagrado, eu não sei o que é.

 

XIII

Leve, leve, muito leve,

Um vento muito leve passa,

E vai-se, sempre muito leve.

E eu não sei o que penso

Nem procuro sabê-lo.

 

Passei a pensar pouco quando escrevo. Este português me disse para assim fazê-lo, parar de pensar e obedecer aos sentidos. Não uma pessoa desenfreada, que obedece cegamente aos impulsos. Mas apreciar o que os olhos me descrevem, saborear o que o paladar revela. Escrever tem impulso, mas sem preocupação, sem urgência. Sentir é deixar-se envolver, é uma folha de hortelã que, aos poucos, deixa seu gosto na água.

Tudo se torna novidade. O aquilo que vi ontem já não tem o mesmo significado de hoje. Depois que li Caeiro, cada dia é um novo dia. O que fiz ontem reflete hoje, mas já não sou a mesma pessoa. Sou simples, com o coração cheio de contentamento.