29 de maio de 2014

3 poemas de Nathalia Rech

dar nome as rochas
o que fazer quando se está em um hospital
ninguém nos atende
pensei que estar em um hospital já era pretexto
para ser atendido
o que acontecem quando você procura um enfermeiro
o mais bonito de todos, aquele com um broche em cada olho,
e abre seu medo como um animal de alfaiataria, lhe cortando e costurando ao mesmo tempo,
“não estás a ver que estou adoentado?”
seu corpo como uma duna que retifica cada mini rochedo
porque estás casando de perder-te os pedaços reclama
então o médico, o mais bonito de todos, aquele com amarilhos em cada olho,
fica a assistir a grande corrida de autorama nos bastidores das veias
você a relatar os sintomas: “quando acordo sempre tenho de juntar
o braço direito do chão”
o que fazer quando o segurança o mais real de todos
aquele com um olho a mais em cada olho
te coloca para fora do hospital com pregos nos pontapés
pregos que pela intimidade imposta acabam depois da pele
você senta no meio-fio com o rosto aberto a tintilar o próprio sangue com a língua
tal como o pincel de um pintor pouco indeciso?
a) você volta para o hospital?
b) você sorri?

*

polegares
a grande trapaça do destino
aconteceu da minha cintura para baixo
mas também da minha cintura para cima
porque tinha pernas e elas não me faziam estátua
pensava minha vida inteira serei pernas
um dia eu e a janela quem vejo as pernas
do tempo correndo super mercúrio chama olímpica
logo meus pés viraram um local de traição
como a palavra cabeceira que é irreal porque
ninguém coloca os cabeças lá
agora tudo que faço quem faz são os braços
com ele escrevo limpo a bunda dou de comer a tumba
doem meus braços tanto que doem penso
talvez as pernas fiquem em cima é uma questão de ponto de vista
sempre respeitei menos as mãos por suas tendências ao apego
as pernas nunca não possuem nem polegar
como o tempo só possui pernas lá também não há
as coisas só passam assim como devem as coisas
são coisas porque passam

*

algodão
existe um bolso especial
para treinar o dedo antes
de apontá-los
aos olhos de alguém

o dedo fica lá por semanas
até estar preparado
deveras

tem dias é preciso não esperar
nada que se apresente
pelo nome

nesse dia um bolso promete
desaparecer e se as mãos estiverem lá
vão junto.

Nathalia Rech nasceu em Porto Alegre/RS, em 1991.