22 de novembro de 2021

A boneca de Kokoschka é também de Afonso Cruz

A obra vencedora do Prêmio de Literatura da União Europeia chegou ao Brasil pela Editora Dublinense em 2021; e posso afirmar que a casa acertou precisamente na escolha. Que livro, minha gente! A engenhosidade da obra é de deixar qualquer leitor de boca aberta. Afonso Cruz escreve de forma simples, direta, poética e metafórica em um livro que — em resumo geral — se passa em uma Dresden bombardeada pela Segunda Guerra Mundial.

É incrível como as histórias contidas nos livros (falo de livros porque existe, aqui, um livro dentro do livro. O livro em questão é sobre a história real de Kokoschka, pintor austríaco que mandou construir uma boneca que se assemelhava a sua esposa) e os personagens envolvidos se entrelaçam de forma magnífica, ao ponto de confundirmos personagens e tempos, e imaginarmos que espaço, tempo e pessoas são todos os mesmos (não sei se vocês me entenderam). As muitas referências contidas — desde fatos históricos até mitológicos — enriquecem a obra de tal modo que deixam a deixam mais interessante.

Para mim, o ponto central de tudo é a questão do tempo e a sua passagem. Perceber que somos, todos — sem exceção –, fruto de um emaranhado de acontecimentos estabelecidos, além de testemunho que outros professam sobre nós é surreal. Somos a história criada por nós e pelos outros — como a boneca que Kokoschka mandou confeccionar.

Falar sobre essa obra é, ao mesmo tempo, prazeroso e difícil; isso mesmo. Prazeroso porque estamos diante de uma das grandes obras da literatura contemporânea, e difícil pelo fato de que o que falarmos não chegará aos pés de sua magnitude. Poucos são os autores que escrevem como Afonso.

Pode ser estranho para alguns — creio que não será -, mas ao ler esse livro, sempre estive pensando nas obras escritas por Kurt Vonnegut — que é homenageado no livro — e nas do Lourenço Mutarelli; com ambos sendo menos poético claro, mas todos com uma entrega direta e um enredo que se assemelha a nós que temos que, ao mesmo tempo que desatá-los, amarrá-los. Quem gosta americano e do brasileiro, vai amar essa obra.

Não é um livro fácil. De maneira alguma. A complexidade imposta faz com que tenhamos um olhar mais apurado sobre os detalhes, a fim de que vivenciemos a experiência completa.

Deixo duas indicações para vocês sobre o livro do Afonso Cruz: Live do canal youtube da Banca Tatuí e também a resenha da querida Bárbara, do canal B de Bárbarie . Além disso, deixo a página que fala sobre Oskar Kokoschka.