2 de maio de 2014

Elogio à vingança

 

Se foi por delicadeza que Rimbaud perdeu a vida, foi por vingança que eu ganhei a minha. Antes de chegar no tutano do assunto já me vejo obrigado a abrir um parênteses como prato de entrada. Perder e ganhar, nesse caso aqui, estou tratando em sentidos idênticos e pouco tem a ver com excelência financeira. Até porque, concordo com o aforista de Capuricinha, ao ver na gravata um sinônimo de morte; e modéstia à parte, sair de casa de bermuda e chinelo sai bem mais caro que andar de paletó de linho.

Parênteses fechado. E vamos embora que o tema é sangue no olho. É pé no bucho e mão na cara. Aqui, onde a insígnia da cruz estreita a mentalidade coletiva, a vingança é sempre vista como algo a ser combatido ou superado, coisa do mal; é estigmatizada pelas páginas policiais. Entretanto, usada com sabedoria, é uma das melhores armas que o ser humano pode portar. O problema é que onde o aprendizado está na mão dos reaças, o direito à vingança pode significar um discurso de ódio e acabar com gente amarrada num poste sob os aplausos dos telejornalecos prediletos da classe médica. Assim como a anulação dela é a total vitória do passivismo.

E já que eu falei da cruz, vou dizer um dos meus mitos favoritos do Jotacê. Aquele que dizem que ele diz tem que oferecer a outra face ao inimigo. Muito boa essa. Não é apanhar duas vezes, como algum tolo pensaria, é olhar pro opressor e dizer: “É isso, é? Faz o seguinte tenta outra vez, mas agora bate mermo.” Não diz o ditado que é um prato que se come frio? Pois bem, taí.

No caso da literatura, vejo a vingança muito mais além do que desmoralizar personalidades com personagens ou distorções do status quo pela ficção. É uma chama de continuidade. Um novo livro é uma resposta à ignorância institucionalizada. Cada linha escrita é pelo cachê atrasado, boicotado ou nem proposto. Cada sarau organizado na tora é pra por na conta da indiferença dos gestores. Contos, crônicas, ensaios e artigos? Tudo feito pra não ter que ficar de puxa-saquismo em troca de migalhas. Anota aí, coração: cada verso feito não é pelo dinheiro. É pela dignidade, porra!

 

por Fred Caju