24 de abril de 2014

Voltei no dia seguinte

Ao invés de trabalhar gosto de ficar bebendo ou indo até a biblioteca para ler jornais de graça. Como naquele dia estava sem grana para beber, fui à biblioteca. E dessa vez havia uma nova atendente. Algumas tatuagens de bom gosto. Piercing estrategicamente entre as narinas e um lenço no cabelo com pimentas estampadas me fizeram ficar obcecado. Ela também tinha um cara de obcecada. Todo mundo é obcecado por algo, alguns apenas não descobriram ainda suas obsessões. A minha era a moça da biblioteca.

Achei que ela tinha jeito de gostar de Dostoiévski. Chamei-a para me ajudar a localizar o escritor nas prateleiras. Então eu tive a confirmação de que ela gostava do cara.

– É foda pra caralho esse russo. – Falou.

– Pois é, eu estou procurando Recordações da Casa dos Mortos. – Comentei, disfarçando minha obsessão.

– Ah, é que o último que levou esse livro não devolveu mais. Sumiu. Mas eu tenho ele. Posso te emprestar.

Sim, ela se ofereceu para me emprestar o livro que ela provavelmente havia lido muitas vezes enquanto estava deitada sozinha em sua cama com os cabelos desgrenhados.

Voltei no dia seguinte para pegar o livro e levei um Tolstói em troca. Ela não estava. Havia um velho semimorto no lugar. Disse que a minha obsessão tinha sido demitida porque a pegaram se drogando no banheiro.

Sentei-me e fiquei lendo os jornais do dia.