2 de abril de 2014

Estradão

Duas luzes vermelhas, piscando alternadamente, cortavam o estradão de terra batida em uma madrugada quente e abafada. No interior da ambulância, uma mãe segurava nos braços um embrulhinho morno e soluçante, chiando de catarro. A poeira que subia no estradão assentava instantes depois da passagem da Ns. do Carmo, que tantas vezes fora chamada para socorrer aos aflitos das casas de taipa, poucas vezes chegando a tempo:

– Moço, tu pode ir mais depressa? – uma voz suplicante.

– Minha senhora, a estrada tá ruim, o carro é velho e a casa do prefeito fica longe. – o motorista, com a frieza adquirida com o tempo de profissão.

O segundo tornava-se minuto. O minuto, hora. A hora era caso de sobrevivência.

Foi na altura da ladeira da fazenda do Major Nunes que o embrulhinho, nos braços da mãe-sertaneja, parou de tremer e suspirou:

– Moço, ele parou de tremer. Será que a febre passô?

– Sei não, dona. Sou doutô não.

Foi questão de pouco tempo para a frieza e a palidez irem chegando. As mãozinhas fechadas, aos poucos ganhando um tom roxo, assim como os lábios. Os olhinhos fechados e a boquinha aberta, a barriguinha, vazia por causa da diarreia, parou de mexer-se:

– Moço, ele não tá mais respirando não. – os olhos, marejados d’água, em busca de uma solução ou mesmo uma palavra de conforto.

– Chupa no nariz dele, dona. Bota o peito na boca dele, que isso é fome. – desviou de um preá.

O resto da estrada foi de choro abafado e a vontade de voltar para casa, pois era apenas o céu ganhando mais um anjinho, que se juntava aos outros seis – da mesma mãe-sertaneja.