6 de maio de 2015

À sombra do ciprestes

É estranho quando você começa a ler autores brasileiros constantemente, pois daí percebe-se que não conhecemos muito da nossa produção, principalmente quando se fala em Ficção. Ultimamente, por mais que se diga, ainda, que a poesia é pouco lida, com a inserção forte de editoras independentes, como a Patuá, que visam a poesia como produção principal da sua linha editorial, esse gênero vem obtendo um pouco mais de força no mercado editorial.

Eu preferiria dizer que o conto ainda é muito pouco lido, quiçá as crônicas, pelo leitor daqui. É sempre preferível ler obras extensas, fantásticas ou fantasmagóricas – eu que pensei que essa moda iria passar – do que pararmos para ler uma obra que fica ali, quietinha, na sombra das estantes, esperando o momento certo de alguém passar e seus olhos encontrarem consigo. Talvez seja essa a representação que eu tenho do livro de Menalton Braff, “À sombra do cipreste”, publicado pela Global.

Quando o livro chegou pelos correios, a primeira pergunta que fiz foi: “Quem diabos é esse cara?”. Lógico que fui até o Google pesquisar. Poucas eram as informações que poderia se obter sobre o livro e, até mesmo, sobre o autor. Apesar de na capa do livro constar que a obra foi premiada pelo Jabuti, no ano 2000, não na categoria de contos, como eu poderia pensar, não indicava que o livro levou o prêmio de melhor de Ficção do ano. Como assim, eu questionei. Como poderia ser possível que um autor que ganhou um Jabuti, sem ser na categoria do gênero em que escreve, pudesse vir a ser tão desconhecido? Eu saí a perguntar entre amigos, escritores e editores, e apenas um punhado soube me dizer quem era Menalton Braff. E só pensei o mais óbvio, como todo e qualquer leitor pensaria, “Nós não lemos nossos autores mais”.

É claro que eu posso estar equivocado. Não retiro essa ideia, mas é um pouco demasiado quando um livro como esse nos chega à mão. Já de início, fiquei a rir, sozinho, vendo a avó a passar o tempo e se divertindo com os disparates do que nos parece ser sua família, seus descendentes e agregados. O conto que leva o mesmo título do livro, já mostra, de maneira sugestiva, um fio de narrativa que permeará todo o livro. A questão de estar à sombra, escondido, ou contido em uma calmaria é algo que é relatado com muita tranquilidade pelo autor e que merece, realmente, uma atenção em como isso estruturado.

A própria avó, escondida dentro de casa, que finge não ouvir ou não entender o que lhe dizem, tem voz rígida quando pensam em derrubar o cipreste que fica em seu jardim. Nesse momento, ela ressurge e conta que ele ali já estava quando ela ‘se deu por gente’. O que poderia, talvez, ser relacionado com o próprio andamento da sombra durante o dia. A avó, que prefere ficar em sua calmaria, calada, percebendo o que lhe ocorre ao redor, em um súbito momento, como se estivesse a desaparecer com a chegada da noite, resolve proferir algo para deixar claro o seu desejo de manterem o cipreste, consequentemente a sombra.

Os contos são curtos, mas alguns de uma dramaticidade carregada de uma intensidade que nos faz  poder ter aquela sensação de se arrepiar, que atualmente é tão difícil de encontrar, como no “O voo da águia”. A frase que é dita no entremeio da narrativa até agora reverbera em mim, devido ao final do conto: “Então, é isso é que é a vida?”. Se for isso, preferirá Aquiles voar como uma águia.

O que fica perceptível em mim é que Braff consegue, de maneira singular, criar histórias que vão sendo refeitas à medida que lemos. Parece que ele apenas sugere o que deveria acontecer, deixando, em alguns momentos, por nossa conta preencher o vazio que ele não nos disse. Mas a criação desse vazio é que o torno diferente de tantos outros escritores, demonstra a experiência em uma escrita que não pode ser vista como a de um iniciante, essa é que é a verdade.

O prêmio concedido a Menalton Braff, aparentemente, não o trouxe à luz da maioria dos leitores brasileiros. Mas, aos poucos, sua obra sairá das sombras e poderá, não apenas durante a noite, entremear os nossos quartos, nossos corações, e poderemos entender que o nosso cotidiano é muito mais profundo do que percebemos. O melhor deve estar sempre à sombra? Bem, talvez seja isso que Braff quer nos dizer, ou talvez apenas queira nos sugerir que algumas coisas nos passam despercebidas e que elas são tão importantes como as obras que, muitas vezes, não conseguimos conhecer.