18 de agosto de 2021

Dia Nobre explora tensões na relação entre mãe e filha

“No útero não existe gravidade”
foi finalista do Prêmio Caio Fernando Abreu
e é lançada pela Editora Penalux 

As tensas relações entre mãe e filha e as diferentes formas de abuso dão o tom do livro “No útero não existe gravidade”, de Dia Nobre. 

No segundo livro da autora, finalista do Prêmio Caio Fernando Abreu (Mix Literário São Paulo), em 2020, a obra se apresenta como híbrida, ao desenterrar chagas íntimas e sociais das mulheres.

O formato, que pode ser compreendido ora como romance, ora como contos, tem uma personagem feminina que é acompanhada da infância à vida adulta tentando remontar mentalmente um quebra-cabeça de memórias e momentos da mãe, após ser abandonada. A personagem é carregada de inquietações, sobretudo a partir da constatação de que ela não possui contorno - que de acordo com a psicologia, seria um aspecto da constituição subjetiva do eu. 

“Quando há uma relação conflituosa entre a mãe/cuidadoras e o bebê, seja de recusa, negação ou falta de conexão com essa gravidez, a criança pode nascer ‘sem contorno’ ou seja, sentindo-se desprotegido; isso pode gerar vários traumas, inclusive, medo de altura, de cair, etc. porque se tem sempre essa sensação de queda, ou seja, de encontro com a gravidade que te puxa pra baixo”, explica a autora, que escolheu uma das frases do miolo para dar título ao livro, haja vista a relação com a percepção de uma criança de que, uma vez abandonada, precisaria confrontar os obstáculos da sua vida sozinha. 

Com capítulos curtos e uma linguagem que flerta, o tempo todo, com a lírica poética e o romance autoficcional. A partir de elementos da vida da própria autora, debate, com profundidade e assertividade, a relação entre mães e filhas, o desejo de não maternidade e a pressão social sobre ele,  já que, segundo a própria, viveu uma situação muito parecida com a da personagem, de se ver sem mãe - sem contorno - durante a adolescência. 

Vale destacar que “No útero não existe gravidade” trata da trajetória da personagem, uma menina, tendo que se descobrir sozinha em meio a diferentes acontecimentos que são comuns às mulheres, como abuso sexual, assédio, automutilação, depressão, entre outras. 

“Qual menina nunca foi assediada por um parente ou amigo próximo? Nossas meninas estão, infelizmente, expostas a todo o tipo de violência, desde as mais sutis àquelas mais evidentes. Pesquisas apontam que os casos de automutilação entre meninas dos 13 aos 16 anos de idade aumentou 68% de 2017 até hoje, e isso tem a ver com a pressão social para se adequar a padrões, pela hiper sexualização das crianças e hiperexposição na internet. A automutilação é uma forma de dizer que algo não vai bem, é um pedido de socorro. A pessoa fala com o corte o que não sabe dizer com palavras. Acredito que é um tema urgente. É algo que incomoda, mas que precisamos falar sobre”, destacou.

O livro traz ainda capa e ilustrações com colagens da escritora e artistas paraense Monique Malcher e, segundo a autora, é uma obra que as pessoas vão se identificar de imediato, sobretudo a partir do reforço da ideia de sororidade e de empatia com as dores de outras pessoas e, principalmente, de como se transformar estas dores em potência criativa. 

“Eu digo que se você for mulher, acredito que você vai se identificar independentemente da sua trajetória ou lugar social porque ele fala de um tipo de relacionamento inevitável na vida que é aquele que temos (ou o que falta) com nossas antecessoras: mães, avós, etc. Se você for homem, esse livro tem muito a te ensinar porque fala da opressão e da violência (do abuso, dos padrões sociais) que as mulheres sofrem cotidianamente”, convida. 

Sobre a autora

Dia Nobre é escritora e Ph.D em História. Natural do Cariri cearense, atualmente trabalha em Petrolina, Pernambuco, como professora universitária desenvolvendo projetos ligados à literatura, história, lesbianidades e feminismo.

Possui dois livros publicados na área da pesquisa histórica, O teatro de Deus (Ed.UFC, 2011) e o premiado Incêndios da Alma, (Multifoco, 2016), tendo recebido três prêmios por este último, incluindo o Prêmio Capes de Teses (2015).

Seu primeiro livro de ficção poética, Todos os meus humores, foi publicado em junho de 2020 pela Editora Penalux. Participa ainda da Coletânea VISÍVEIS – I Anuário Filipa Edições (2020), da Antologia Antes que eu me esqueça da Quintal Edições (2021)  e foi selecionada na categoria Conto do Prêmio Off Flip de Literatura 2021. Em maio de 2021 lançou seu segundo livro de ficção, No útero não existe gravidade, também pela Editora Penalux.

Leia um trecho da obra aqui e compre o livro aqui