6 de setembro de 2016

A revolução começa no chuveiro

Quando se pensa em ideias inovadoras, logo vem à mente a imagem de Arquimedes abandonando uma banheira nu, enquanto grita “Eureka!” e corre em direção à cidade de Siracusa com a solução definitiva para um grande problema levantado pelo próprio rei.

É possível perceber nas redes sociais, sobretudo no Facebook, que a internet é uma teia inimaginável de outra forma.

Há conexões entre pessoas que não seria possível fisicamente, por carta, por telefone ou por qualquer outro meio que não fosse vinculado à internet.

Se isso não causa nenhum assombro atualmente, era uma ideia realmente revolucionária e sem precedentes quando foi concebida no final da década de 1960 e que somente chegou efetivamente ao Brasil já tardiamente em 1997 com as velozes redes de 64kbps da época.

O fato é que a internet; o streaming e as chamadas de vídeo, áudio e música; o Facebook, o Whatsapp, o Instagram e todo o resto (que inclui já o novíssimo viral Pokémon GO) são fatores extremamente estimulantes para o cérebro ao mesmo tempo em que são distrativos poderosos da realidade em derredor.

Seja no carro, ao comer, ao usar o banheiro, em casa, no trabalho ou onde quer que se esteja e qualquer que seja a sua atividade, estes dispositivos eletrônicos estarão lá para lhe fazer companhia e distrair a sua mente com coisas importantes (ou não), para que você não perceba o transcurso das horas, dos dias, dos meses e dos anos e para que não perceba que a morte está chegando tão rápido que você não terá oportunidade de aproveitar a vida.

Este bombardeio de informações e de distrações tem acompanhado o pós-moderno até na cama. Os sonhos, que, até o fim do século XX, somente cabiam aos deuses inspecionar, são embalados pela música e por filmes e séries de TV que os conduzem, os moldam e os abreviam.

Esta preocupação é tão grande que se criou até outros aplicativos eletrônicos para controlar os males que os dispositivos eletrônicos já fazem, uma atitude um tanto contraditória.

Em meio a tanto ferro, alumínio e nióbio, parece que o único refúgio para a vida online é dentro d’água e, já que nem todos têm acesso diário às cachoeiras, lagoas e nem banheiras, é somente debaixo do chuveiro, portanto, que o bloqueio da insanidade do mundo digital se torna possível.

Aliás, não foi coincidência ilustrar o início deste texto com a famosa “Eureka!” de Arquimedes.

Um banho morno (27ºC a 39ºC) pode fazer o corpo relaxar, porque “o calor dilata os vasos sanguíneos da pele, faz fluir melhor o sangue e o oxigênio para o cérebro e relaxa os músculos, o que ajuda muito na sensação de bem-estar”.

Além disso, um banho quente pode liberar grandes doses de endorfina, que é considerado o hormônio do bem-estar, semelhantemente a um orgasmo em miniatura, para fins de comparação.

A água morna, também, libera no cérebro a dopamina, uma substância produzida pelo corpo, que está envolvida no controle de movimentos, aprendizado, humor, emoções, cognição e memória.

E É AÍ QUE MORA O PERIGO!

No banho, algo extremamente incomum na sociedade pós-moderna ocorre:

1) Excepcionalmente, não se está ligado ou conectado em aparelhos eletrônicos de nenhum tipo por causa da água;

2) Por alguns minutos, não se está concentrado em nenhuma tarefa específica porque não dá para fazer muita coisa enquanto se está encharcado e com as duas mãos ocupadas;

3) A água morna faz pausar o cansaço e as preocupações por um instante, ao mesmo tempo em que ativa sua memória, suas emoções e sua cognição.

Não é preciso muito raciocínio para compreender que esse ponto fora do espectro do cotidiano pode levar o indivíduo a ter grande clareza sobre a própria vida e um pico de criatividade fora do comum.

Essa adição de criatividade e clareza incomuns pode resultar em grandes ideias produtivas ou, até mesmo, em protótipos de planos de revolução social.

Todas as forças sociais convergem para o controle do pensamento do indivíduo pós-moderno, por isso – talvez – haja tanta implicância com a duração dos banhos.

Em nome da economia e da conservação do meio ambiente, se exige que os cidadãos tomem banhos mais rápidos, mas não conseguem justificar como é que em todo o consumo de energia elétrica do país a parte que cabe às residências não ultrapassa muito os 28% numa proporção de mais 74 milhões MWh para o consumo total e menos de 21 MWh para o consumo estritamente residencial – dados do Ministério das Minas e Energia de julho de 2016.

Ora, qualquer um consegue perceber que é mais fácil economizar entre os 72% da energia destinada à indústria e ao comércio do que esgoelar ainda mais o consumo dos lares dos brasileiros.

Parece bastante coerente, considerando todo o cenário em que se vive nos grandes centros atualmente, que o motivo de tentarem barrar o seu banho longo é mais uma tentativa desesperada para garantir a manutenção do status quo e ao mesmo tempo impedir as mudanças sociais que o país precisa, do que algo que tenha relevância ambiental, por exemplo.

Portanto, entenda que, quando querem cortar o seu banho pela metade, na verdade, estão querendo é cortar a sua aposentadoria, seus direitos trabalhistas, seus direitos de acesso ao ensino público gratuito de qualidade e tantos outros.

É duro perceber que há ainda quem aproveite seu banho sintonizando a televisão, as rádios ou bandas musicais da moda ou ainda outras formas de distração para a sua mente, quando poderiam utilizar este tempo exclusivo para cantar, para pensar em bobagens e fazer planos para a família, para o lazer e para a autolibertação.

Rebele-se e tome banhos diários de meia-hora ou mais!