29 de janeiro de 2016

Entrevista com Samir Machado | Não-Editora

A não.editora existe desde 2007, é uma das editoras independentes que chama a atenção entre a enorme quantidade de pequenas casas editoriais brasileiras, e já ganhou prêmio de melhor editora, no ano de 2008, no Prêmio Açorianos. Não apenas porque possui um apuro no design, suas capas, ampla maioria assinadas por Samir Machado, que também é um dos editores , chama a atenção pela beleza, mas pelo conteúdo que produz. A não.editora publica poucos títulos por ano, porém é o necessário para ter alguns de seus livros entre os finalistas de grandes prêmios. Hoje, a não.editora é um selo editorial da Editora Dublinense.

Sendo assim, visando entrevistar ampla maioria dos editores do país, Nathan Matos, nosso editor, bateu um papo com Samir Machado, que além de editor e designer, é autor de "Quatro Soldados", publicado pela não.editora.

 

De onde veio a ideia de criar a Não Editora?

Da experiência de publicar o primeiro volume de Ficção de Polpa, em 2007. Nos conhecemos todos mais ou menos ali, alguns já se conheciam de oficinas literárias, como a do Assis Brasil, e como tínhamos experiências diversas na área editorial – design, revisão, assessoria de imprensa – nos pareceu que tínhamos tudo em mãos para criar nossa própria editora.

O catálogo de vocês possui apenas 26 produções. Por qual motivo se dá essa “lenta” produção do livro? Se dá pela restrita e bem definida linha editorial?

De certo modo, sim. É difícil para nós definir os elementos que fazem com que um autor e uma obra tenham a “cara” da Não Editora. Mas, ao mesmo tempo, quando surgem, fica muito claro que é aquele tipo de literatura que queremos publicar. Hoje a Não Editora é um selo da editora Dublinense, mas o cuidado editorial que temos é ainda o mesmo na época dos nossos primeiros livros.

Como vocês escolhem as obras que entrarem no catálogo?

Não existe um processo. A ideia inicial era fazer da editora um trampolim para lançar e divulgar autores novos, nossos próprios trabalhos e do pessoal que conhecíamos nas oficinas literárias de Porto Alegre, e fazer isso com qualidade editorial e gráfica. Nosso modelo nisso, sem sombra de dúvida, foi a Livros do Mal.

Em 2008, quando completavam 1 ano de vida, vocês ganhavam o título de melhor Editora do Ano, no Prêmio Açorianos, e anos depois também tiveram um dos seus livros, Os fingidores, de Rodrigo Rosp, entre os semifinalistas do Prêmio Telecom. Como vocês percebem a importância dos prêmios para os novos autores?

A importância é, acima de tudo, em termos de visibilidade. Em meio a um mar de clássicos relançados, best-sellers de divulgação opressiva, e autores consagrados que não precisam de muito para se fazer conhecer, o prêmio – na verdade, só a indicação ao prêmio – já é uma forma de tornar mais conhecido o trabalho de novos autores. Isso e também o reconhecimento pelo trabalho, claro, que escritor é tudo carente.

É intrigante saber que na apresentação da editora, no site de vocês, que desejam que o público não tenha vergonha de querer um livro pela capa. Isso é uma deixa para evidenciar a dedicação que possuem com o projeto gráfico do livro?

Em parte sim, mas também porque, como bibliófilos, acreditamos que o livro enquanto objeto deve espelhar a qualidade da obra enquanto arte. Um bom livro merece um bom tratamento gráfico, que faça jus ao trabalho do autor.

Como a editora se posiciona frente ao mercado de livros eletrônicos e grandes lojas como a Amazon?

Nossos livros estão disponíveis em todos os formatos. É claro que, no que dependesse de mim, só se leria livros impressos, porque amo papel, no que não sou unanimidade nem dentro da editora. Mas o importante é que o autor seja lido.

Vocês possuem um projeto que é a publicação de livros de ficção, tendo criado o projeto Ficção de Polpa, que publica histórias variadas, mas com uma forte ênfase nesse tipo de narrativa. A ficção brasileira, parece, ainda não ter conseguido deslanchar da mesma maneira que as obras estrangeiras. Saberia dizer a que isso se deve?

É complexo. Existe uma ficção brasileira vigorosa, com um público cativo, mas ela obviamente não tem o alcance comercial de best-seller que a maioria dos autores estrangeiros possuem, salvo exceções.

Algumas editoras menores têm vendido seus livros apenas por suas lojas online. Vocês possuem a própria loja, mas também vendem em outros espaços. Como vocês veem a atuação das pequenas editoras no mercado brasileiro, que acabam não tendo a mesma condição de concorrer com quem já conseguiu uma distribuição razoável como a da Não-editora?

Há nove anos, e-books ainda não haviam estourado e ter uma loja online era um processo custoso. Abrir uma editora parece uma ótima ideia no começo, mas é só o primeiro passo; conforme vamos publicando mais e mais livros, eles precisam ser guardados em algum lugar, não dá mais para deixar “na garagem de alguém”, e conforme a rede de distribuição vai se ampliando, a logística disso vai se tornando um processo cada vez mais custoso. Mas é parte do processo. Ainda considero a Não Editora uma editora pequena, e o papel dela, assim como o de todas as outras editoras, acabou se tornando o de abrir espaço para novos autores onde as grandes editoras não abrem. No final das contas, se tornou nosso papel correr os riscos.

Vocês creem que ainda é possível haver espaço para a criação de novas editoras? Ainda são muitos os nichos que podem ser abarcados por novas ideias?

Enquanto houver leitores, haverá livros, e alguém precisa editá-los. Ou como gosto de dizer: para interpretar o passado, leia os clássicos; para o futuro, vá ao astrólogo; mas para interpretar o presente, é preciso ler literatura contemporânea.