3 de abril de 2015

Tentando parecer plausível ao fingir que não estou copiando descaradamente o DFW¹

Proposta letárgica: um estudo pseudo-filosófico-científico escrito por um homem que se apaixonou por si mesmo antes de estupidamente doar sua massa cinzenta às substâncias – “estudo”, este, conhecido pelo pequeno grupo que atingiu como Ode ao analfabetismo filosófico funcional ou Exibicionismo verborrágico de um prisioneiro de si mesmo frustrado com a falta de atenção que não recebeu quando necessário em tempos passados. Parágrafo: do latim, lethargia (sic?). O sujeito está jogado, inútil, fisiologicamente impossibilitado de exercer as funções mais básicas que, dizem, dignificam ou afirmam o homem (homo sapiens); algo como um retorno completamente humilhante à condição de bebê sem ser mais um bebê – muito pelo contrário, sendo um ser viril no auge de suas faculdades mentais e físicas ou, pelo menos, no que deveria ser o auge das duas condições citadas, daí a suposta humilhação. Fato é que a inabilidade do autor frustrado, que gostava de se chamar escritor e poeta, me impede de transcrever o estudo por completo; para evitarmos demasiada fúria do coitado do leitor, encurtemos:

Aqui, faz-se a defesa da letargia como uma estratégia de defesa contra a imposição do movimento. Ditadura da busca. Busca pela felicidade, o autor quer dizer. Quando nascemos, o necessário é que sejam saciados nossos impulsos animalescos e, com o passar do tempo, cria-se um mundo “fictício” dentro do Todo Real (isto é, dentro do planeta em si, que continuará existindo mesmo com a ausência do fictício [compreendo que num delírio existencialista sem fim você pode tentar se apoiar em Sartre e questionar: se uma árvore caiu e ninguém ouviu, a árvore fez barulho?, mas sejamos sensatos e ignoremos A imaginação]). O repugnante quadro social atual talvez tenha sido criado/alimentado para preencher algum impulso-simiesco cativado por séculos, que talvez tenha nascido com a comparação peniana e artística lá no tempo rupestre, quando dizem que caçávamos pra sobreviver e ilustrávamos as paredes da caverna e talhávamos madeira no que com certeza só pode ser chamado de princípio da arte (seja lá que merda você entende por arte) e que, enfim, claramente tudo isso saiu do controle – a não ser que você seja do tipo que consegue acordar e pensar que belo dia ou mesmo verbalizar isso, aí tem alguma coisa muito errada ou certa com você, digamos certa, porque enquanto você consegue viver bem a ficção autoimposta e rir, gargalhar mesmo, feito hiena, de qualquer merda que não tem nenhuma graça, eu, o gênio subjugado, fico encolhido no meu canto parcamente iluminado que pretende a erudição e redijo, isto mesmo, redijo não escrevo ou versejo, textos tão truncados e chatos – como este – que de tão truncados e chatos e contraditórios e hipócritas nem consigo reler depois, na esperança de que algo vá se modificar e se adaptar ao meu gosto, pois na condição de centro do universo é claro que estou certo, além do mais eu descobri toda essa farsa e estou descrevendo-a com perícia, o que me faz especial, apesar de que este argumento podia ter sido usado por Hitler e sua pretensa soberania ariana, então, enfim – esperança infundada, eu sei, com certeza uma utopia, pois estou lidando com estúpidos, que são vocês, os que conseguem viver a vida como ela é – e eu não consigo, então digamos que eu esteja neste exato momento mais ou menos babando de raiva. Dito isso, acho que é óbvio o parâmetro que deve ser feito na proposta (des)evolutiva comentada, isto é, quais são as exibições de hoje no mundo-dentro-do-mundo, que podemos facilitar e chamar de Mundo social e Mundo real – um paralelozinho legal até que dá pra fazer com o Mundo das ideias e o Homem da/na caverna e tudo aquilo lá que você já deve ter estudado ou lido sobre ou visto em algum site duvidoso só para dizer que conhece. Talvez o Zen já tenha respondido todos os questionamentos que estou levantando aqui, já tenha proposto o caminho correto para se distanciar dos desejos mundanos que trazem frustrações etc., mas estamos no Ocidente e o berço do Zen não é aqui, então meio que se foda o Zen. A luta conceitual e física que quero e preciso impor – impor, isso mesmo, já que estamos confrontando outra imposição (a nível global) – é o contraponto do movimento: a morbidez, a letargia, o proposital não uso do lobo frontal na medida do possível, o se comportar como um completo imbecil, seguir seguindo o conselho imortal de Baudelaire (“ser um homem útil sempre me pareceu uma ideia horrenda”, dos seus Diários íntimos); instaurar a busca pela ausência da – aparente – felicidade no mundo moderno, no mundo da informação instantânea, do saber imediato e tão profundo quanto a poça d’água formada depois de uma garoa fina, do psicólogo que meio que secretamente vai ao psicólogo que também vai ao psicólogo ad infinitum, da sinapse obrigatoriamente dopada a fim de evitar a catalepsia, do círculo social sustentado por alterações e assim por diante; construindo um exército de mortos-vivos – completamente descartáveis para a engrenagem social, mas seguindo essa linha como forma de protesto, o que é conhecido como morrer pela causa.

Em dado momento, movido pela fúria cocaínica combinada à sua estupidez padrão, o grande criador de teses se contradiz e propõe algo que não tem nada a ver com a proposta inicial, mas serve como um registro inestimável (só não sei pra quem) de um projeto de repaginação social, atacando com a mesma forma que ele se sentia atacado diariamente: que voltemos à caça, ao canibalismo (já vivemos esse período?), à época de ouro de Abraão e o incesto, o... Fim do arquivo. (Não é bem como se eu fosse um grande fã desse cara, mas a vergonha me obriga a interromper. Se você, nobre digno e caro leitor, não gostou da interrupção abrupta e que quebrou o ritmo do texto, sugiro que da próxima vez vá com muita boa vontade e faça suas próprias pesquisas, caralho, aí ia me poupar deste trabalho de merda que odeio e eu ficaria bebendo o dia inteiro, por meses e anos esperando a icterícia, brilhantemente concluindo que o mundo é injusto etc.)

Em resumo, até que enfim, basicamente tudo isso significa que a salvação depende duma vagabundagem generalizada como forma de protesto contra a ditadura da busca do contentamento irracional neste mundo-dentro-do-mundo (i.e. sociedade v. planeta terra). Analisando racionalmente, afirma-se que o escolher se tornar vegetal não deixa de ser tão cretino quanto o se doar à ficção social (que deixou de ser ficção – no sentido pejorativo – quando se tornou regra existencial – transmutação dos valores) e cabe somente a você escolher como se afundar. Desembarcar no porto mais próximo ou na ilha paradisíaca dos sonhos não é uma opção.

 

[1] David Foster Wallace, escritor norte-americano que se enforcou em 2008.