25 de setembro de 2014

Entrevista com Saulo Ribeiro (Editor da Cousa)

Conheci a Editora Cousa através de um amigo, o Eduardo Lacerda, que me falou que alguém, no Espírito Santo, também tentava editar livros. Indicou o Saulo, daí começamos a nos falar, obviamente, sobre livros. Sempre fui um interessado por edição, o objeto livro pra mim sempre foi uma obra de arte, e seu conteúdo algo que não sei definir em palavras. Sendo assim, nada mais simples do que conversar através do inbox do facebook e fazer uma entrevista para encurtar a distância. Segue aqui, perguntas simples, porém essenciais para que autores e futuros editores possam entender um pouco mais sobre editar e editoras independentes.

Saulo, de onde foi que surgiu a ideia de criar a Cousa?

Foi em 2009. O meu sócio, Rodrigo Caldeira, fazia livros de maneira totalmente amadora e artesanal em casa. Eram tiragens de um único exemplar para amigos. Eu sou dramaturgo e uma peça minha ganhou um edital público para circular em várias cidades. Pensamos em fazer o livro para acompanhar a peça (Cárcere, parceria de Vinícius Piedade). Deu tão certo e foi tão gostoso fazer que não paramos desde então.

Qual o foco da linha editorial da Cousa?

Literatura em geral, teatro e dramaturgia. Mas temos ensaios, memórias e, em breve, roteiros cinematográficos e fotografia.

Vocês acreditam que há um público que sente falta da publicação de roteiros cinematográficos, tendo em vista que não é um gênero que tem um alto número de publicações?

Como o custo de produção caiu e, por outro lado, estamos inseridos em guetos artísticos, um roteiro acaba vendendo a mesma coisa que um livro de poesia ou teatro.

Nesses últimos cinco anos, percebe-se que novas editoras surgiram no mercado editorial, principalmente as editoras independentes, que quase sempre possuem uma linha editorial muito bem demarcada. Como você vê todo esse cenário?

Nosso catálogo não foi previamente demarcado. Nós começamos com uma peça de teatro e fomos aceitando o que nos agradava, independente de gênero. A Cousa é uma das poucas editoras do Espírito Santo e procuramos dar vazão a quem nos procura com uma proposta consistente.

Você acredita que ainda há espaço para novas editoras?

Sim, há. O que não quer dizer que exista um mercado consolidado. Nós estamos criando nosso mercado e modelo de negócios, buscando mecanismos de sustento fora do mercado tradicional (que, em termos de literatura, está em crise). Não é fácil, mas é um combate bom.

Editar livros, no Brasil, é fácil?

Não. É difícil. Às vezes, um sujeito me procura e jura que escreveu um excelente livro e que vai vender muito. Eu pergunto qual foi o último livro de autor estreante que ele comprou e a resposta é vaga, vazia. Tem muita gente escrevendo e pouca gente lendo. Vender um livro hoje é quase um movimento de luta de solo. Tem que pegar o leitor e dar uma chave de braço nele até ele levar a obra. O autor tem que mobilizar seu círculo de leitores e amigos.

O que fez Saulo Ribeiro se interessar pela literatura?

Os livros da minha vida me ajudaram a seguir em frente. Eles traduziram o mundo para mim. Miller, Bukowski, Marcos Rey, João Antonio, Lima Barreto me fizeram perceber que tinha gente com os mesmos pesadelos que eu. E em cada livro que leio eu continuo buscando essa tradução do mundo, das coisas.

Algumas das obras da Cousa são peças, como é o processo de editoração de livros assim? Há alguma diferença quanto aos gêneros poesia, ensaio ou contos?

Sim. Há uma preocupação com o encadeamento do texto, que é diferente da prosa e da poesia. Mas, por outro lado, também é verdade que hoje as linguagens se aproximam muito. Existem textos de teatro que se assemelham a romances, contos, poesia. E o contrário é também ocorre.

Com a entrada da Amazon em solo brasileiro, você pensa que será mais difícil para as pequenas editoras conseguirem um maior avanço entre os leitores brasileiros?

Não vejo este problema para a Cousa, pois nunca vislumbrei um alcance maior para nossos livros. Eles são vendidos no lançamento e ficam disponíveis em nossos sites e redes sociais. As editoras independentes, acredito, não ganham e nem perdem nada. Nosso combate se faz em outra frente. Nossa venda de livros se faz com um contato maior com o leitor, com o círculo do autor. Lancei o livro de um autor espanhol célebre, chamado Fernando Arrabal, e até agora só vendi 20 livros, pois não tive o autor no evento de lançamento (veja só!). Nosso luta é no chão. É a literatura jiu-jitsu, como afirmei acima. Mas as pequenas livrarias, certamente, somam mais um problema nessa luta.

No Espírito Santo, há outras editoras independentes? Como está sendo a movimentação do sistema literário na tua cidade e em teu estado?

Sim. Temos algumas, posso citar a Pedregulho e a Aves de Água. O pessoal do Tertúlia, um site de literatura, costuma publicar alguma coisa em papel vez em quando, além de e-books. Em Cachoeiro de Itapemirim, terra de Rubem Braga, tem a editora Cachoeiro Cult, que lança livros e faz uma revista de variedades. Estamos em um excelente momento. Muitos escritores se encontrando, apoiando. Grupos de discussão e criação surgindo. O pessoal do NEPLES (Núcleo de Estudos e Pesquisas da Literatura do Espírito Santo), vinculado à UFES, está suporte e fomentando muitas ações. Às vezes, penso que estamos vencendo a guerra. E tem hora que acho que estamos cercados. Mas temos cavado trincheiras dia e noite por aqui. Editar e escrever é isso.