12 de março de 2014

Dizem Que os Homens Ainda Amam

homenagem a Moreira Campos

 

Chego a acreditar que é impossível que as rosas não exalem perfume quando são dadas com amor. Seu Campos era um senhor que, entre outras particularidades, tinha como passatempo favorito as tardes de passeio pelas ruas da cidade de Fortaleza – das primeiras décadas do século XX, vale lembrar –, sempre apreciando os edifícios e as construções que pareciam dominar o cenário da terra de Iracema. Com sua experiência, sentia que a modernidade e o progresso estavam modificando a geografia fortalezense.

Em seu fusca verde, no qual se via na parte traseira um adesivo velhinho, já com as pontas desprendidas, onde estava desenhada uma coruja, colocava-se a observar as igrejas, os museus e os bondes, que exalavam um saboroso cheiro de graxa; além da famosa Praça do Ferreira. Outra particularidade sobre Seu Campos: ele, assim como eu, seu narrador, não se empolgava com o carnaval. Toda aquela bagunça e chafurdaria ele observava de longe. Não lhe agradava aquela algazarra pelas ruas da cidade. Mas este espírito anticarnavalesco não se acentuava também à dona Maria José, ou Zezé, como queiram, esposa de Seu Campos.

Quando ainda namorados, Seu Campos ao longe observava Zezé passar fantasiada, dentro de um carro, no Ideal Clube. E como Zezé ficava tímida ao avistar aquele que seria seu esposo e companheiro para toda a vida. Ah, e quão belo de se ver era aquele amor! Casados, Zezé e Seu Campos viveram em diversos lugares na cidade de Fortaleza. Mas, outra particularidade cabe aqui lhes contar: sempre moraram próximos a floriculturas; é do cheiro das flores que o romântico gosta.

Todas as tardes saía o bom senhor Campos – em seu fusca verde – até uma floricultura, e as mais belas flores escolhia com carinho e trazia para a companheira, ainda ao cair da tardinha. Todas as tardes. E aquela relação de amor, amizade e afeto era regada com perfume de rosas, margaridas e pelo cheiro doce dos agradáveis lírios. Todas as tardes uma flor para o jardim de Seu Campos, que cultivava com a mesma empolgação do jardineiro que permanece fiel desde o seu primeiro contato sentimental com suas mais cheirosas flores.

O tempo passou, e no quintal do motorista do fusquinha verde podia-se sentir o agradável aroma das flores há muito cultivadas; o cheiro das rosas acompanhadas de olhares tenros e suaves; os beijos respeitosos sobre a testa da mais bela rosa da vida do professor da arte de contar histórias. Seu Campos nos deixou.

O quintal floresceu em cor e perfume, o jardim transpassou muros e portões, invadiu a cidade, pois esta é apenas uma das lições que Seu Campos nos deixou: ainda não está totalmente perdida a sensibilidade de cultivar e escolher flores, e, com amor e respeito, entregá-las a quem nos faz o coração palpitar mais forte, pois dizem que os homens ainda amam.