19 de abril de 2017

A poesia de Fernanda Vivacqua

Fernanda Vivacqua é nascida no Rio de Janeiro, em 1992, vive desde a infância em Juiz de Fora, Minas Gerais. Licenciada em Português e suas literaturas, pela Universidade Federal de Juiz de Fora, instituição onde atualmente cursa o mestrado em Estudos Literários. Em 2016, lançou seu primeiro livro, “Maria Célia”, pela Edições Macondo.

 

era tempo de quintal
tempo das árvores
quando eu ainda queria saber
o que aquelas pessoas
de fora
do portão pra fora o que
se pensava enquanto eu
de dentro
no quintal de pés descalços
no meu quintal tinham duas árvores
um coqueiro
uma mangueira
manga é doce cai nos nossos
pés são fáceis de escalar
naquele tempo de quintal
eu amava a mangueira
enquanto lá fora eles
pensavam em coisas que eu
não poderia saber
e quando me disseram:
— vamos cortar o coqueiro
eu não liguei
ele não me dava manga
nem perfumava minhas mãos
já agora laranjas
nós matamos o coqueiro
para ele não nos fazer mal
nós matamos o coqueiro

 

*
no meu quintal não havia maldade
de dentro era estação de manga
mas e eles o que acharam
eu tive um sonho
um filme e eles
carregavam o coqueiro para
fora ele era meu
e eu agora sei
dos fios entre os dentes
— há árvores de 500 anos
você diz
mas não o meu coqueiro
pelo qual não chorei
não choraria
nem pela casa ou
pelo quintal
é tempo de mangas no supermercado

 

*

 

buscamos uma palavra nova
as velhas se misturam no balde e
a multicor que escoa nos lava os
pés já agora e dispersam

eu também ouço disparos

 

*
eu fechei.
e depois nada importa
dos vestidos e dos cafés
dos bons homens e daqueles
não tão bons que
me atravessaram e quando
uma louça partia a gente
fingia não se reconhecer
aos poucos habitamos a mesma casa
em um pacto de silêncio e sobriedade