9 de novembro de 2016

A poesia de Airton Souza

Airton Souza é poeta, professor e nasceu em Marabá, no Pará. Possui uma intensa atividade voltada à promoção do livro e leitura, como realizações de saraus e encontros literários entre escritores e leitores, reconhecidamente um dos maiores ativistas culturais das regiões do Sul e Sudeste do Pará. Já venceu diversos prêmios literários importantes, entre eles, o III Prêmio Nacional de Literatura da UFES, promovido pela Universidade Federal do Espírito Santo, com o livro Cortejo & outras begônias (2016). Tem 24 livros publicados e alguns inéditos.

 

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é sob a tragédia
armadura tingida de aço
deambula tristeza
infinita de homens diários
nos hilários olhos
passeiam distâncias em ânsias
sôfregos jardins desconversam
a importância das borboletas
arraigando os hediondos passos antigos
a não encerrar quintais
estranho
o combate desfaz a carne de ontem
num percurso impossível
de abandonados dias
homens sabem dos sóis
das sombras das pedras
mas a primavera sempre vem
avisar-lhe do objeto final:
morrer.

 

***

 

o cômodo
esbravece mania pela geometria
[ a dimensão desvelada dos rumos ]
& o inexorável vestígio das épocas
os cílios têm fronteiras
metafísicas habituais
dos ritos
as mãos
modelam o simulacro das pedras
que sempre reservam
o direito de não esquecerem
os pássaros
os pés argumentam
a uniformidade do muro
urdem táticas
a moverem ávidos esquecimentos
amanhã
o corpo
quiasma trancafiado
noticiará o incomunicável
sentido da morte.

 

***

 

se a casa espera
cheia de áspero artifício
o corpo sobre o acaso
rumina insepulta memória
o chão caiado
a abdicar lições de beleza
no (en)canto das (in)verdades
a casa cifra terreiros
varanda quintais
enquanto os varais balançam passados.

 

***

 

de peito em contingência
atravessar a urbe
& seus rarefeitos dilemas
cruzar os rumos alariados
num rumor dos confidentes incontestáveis
aonde ir com o coração
em languidade?
com esse temor
meridional por becos?
com essa fé
em calçadas circunspectas?
e essa aparente
compaixão nos homens?
a urbe pede:
levar as cinzas dos instantes
no sentido do ressuscitar
outras mortes.