10 de agosto de 2016

A poesia de Rodrigo M. Leite

rodrigo m leite nasceu na zona sub de teresina – piauí em mil novecentos e oitenta e nove. é formado em letras – português. edita o blogue antológico a musa esquecida. desde dois mil e doze publica livros independentes e fanzines com seus poemas, entre eles: a cidade frita, zona sub, tara, a cidade revisitada & seus leões, ser movediço, zine d'a musa esquecida, a cidade frita ilustrada. tem poemas publicados em jornais, revistas e portais. contato: rodrigoemeleite@gmail.com | rodrigomleite.blogspot.com.br

bichos-madeira à beira de um incêndio ou no acostamento cactos nem aí

árvores secas e sem folhas
são os vasos sanguíneos do sistema agreste
fossilizadas no ar quente
não servem de sombra para o gado magro elegante

bodes realizam rituais
danças macabras sobre o asfalto
enquanto os autos desviam irritados
crianças acenam encantadas

ao pé do morro
sinais de fumaça atravessam a palhoça com paredes de taipas
brotam do chão ácido e vermelho labigós sujas de fogo

[apressadas
[com mensagens da guerra que desconhecemos
[para os escorpiões cintilantes

ponte-sobre-o-riacho-quati, riacho quati:
poça d’água amarelada
espelho para visões e presságios eu líricos

temido homem regional
billy joão demarca o verso das placas da estrada vazia
com iniciais de seu nome

espanta os fantasmas que o persegue
escreve um poema inédito

 

doce é a tarde dos metais ou tempero meu verso com sabores moídos

desvendando gavetas, veredas domésticas
à procura do açúcar
atravessar a casa de pés descalços

quando a tarde cai sobre os lençóis
e a casa silenciosa
a fumaça da brasa é sensual

verduras brotam sem fúria
formigas migram e entram no perímetro
das laranjas que despencam sorridentes

a música é um som enferrujado
o barulho agreste do despertador

 

nenhuma sereia serena

à margem do rio terra vermelha noite açafrão
aceito o convite proposto pelo céu
um caminho de constelações acesas meu corpo
vaga o lume das estrelas
uma embarcação à deriva
à procura dos mistérios envoltos nas cercanias do capinzal
a noite adensa provocações e convites
embalo das águas vai-mas-vem das canoas
cricrilar dos grilos
baldio entre brumas
namoro os aspectos fugidios
assombros vaporosos atrás de arbustos
assobios de seres estranhos imaginários
ninfas vulneráveis zanzando névoa eu selvagem
córrego de signo esfomeado pela quinta
onde galhas ferem meu curso
semiárido de quebradiça
pele agreste

piauí sul experiências¹

Quando escrevo cerrado digo metafórica camada regional
com salgadas imagens carregadas enferrujados
materiais retorcidos sob nuvens de contorno grave
assombros vaporosos que invadem terreiros
percorrem hectares de grãos
desaparecem desapercebidos montados numa égua cega no cio
o destino sempre paralém

Quando escrevo cerrado lembro mangas verdes o cheiro de sal
insinuações crepusculares entre os ásperos caibros com felpas
transfiguras no teatro de paredes amarelas e cerâmicas antigas
sombraspectos sensibilizados pelo meu ser moreno
sépias da infância souvenir's do fundo do rio

Quando escrevo cerrado leio velhos encostados na antiga parede da casa dos temperos
sabores moídos condimentos ingredientes da tarde mistério
quando fumo e cachaça são tragadas com suor
quando a agitação das folhas mortas secas saudades de casa
quando laranjas no átrio despencam sorridentes
sobrados sem brilho falso

Quando escrevo cerrado vejo insetos de areia duros no quarto dos aracnídeos
[abandonados
bulbasauro um sapo que alimento ancião designado para fechar o dia
amortecer desejos dos corpos inclinados na rede
reacender vaga-lumes
incitar ninfas no terreno vadio
[1] ao poeta rubervam du nascimento