2 de agosto de 2014

Nicomedes, o careca

O que pode um careca fazer para substituir o cabelo? Atenção: não vale fazer implantes! Um careca pode usar uma cabeleira, pode usar serpentinas, pode colocar uma meada de lã, pode usar esparguete. Pode? Pode mesmo? Não, não pode. Não pode, mesmo que seja muito vaidoso, que adore carnaval, que goste do quentinho da lã e que se perca de amores por um bom prato de esparguete.

Vamos lá saber a razão. Nicomedes, o careca é a história de um homem que, não lidando bem com a sua calvície, tenta encontrar soluções para o que considera um problema. Sempre que Nicomedes escolhe um adereço para cobrir a careca, algo de inesperado lhe surge na cabeça. Tudo começou com a sua primeira escolha, uma cabeleira. Logo lhe surgiu um cabeleireiro. Isso aborrece profundamente Nicomedes. Por isso, decide nada colocar.Nicomedes-Pt_01

Ao longo de 44 páginas, numa sucessão de eventos que divertem o leitor (e por leitor entenda-se, aqui, aquele que interpreta a ilustração e lê o texto e aquele que interpreta a ilustração e ouve o texto), os autores, Pinto e Chinto, ensinam com maestria como a persistência é um valor que resulta em benefício para quem a preserva.

A dupla de galegos não surpreende. A qualidade já é norma nas obras de sua autoria. Destinado a um público infantil, ou seja, para ser lido por miúdos e graúdos, Nicomedes, o carecaé mais uma boa edição da Kalandraka, editora grande no mundo da edição para pequenos.

Apesar de não assentar numa linha narrativa contínua, esta história, essencialmente construída sobre quadros independentes, ganha consistência pelas surpresas e pela imaginação de Nicomedes que, página a página, prendem o leitor.

Esperem, esperem! O nosso herói tomou uma decisão: «Nicomedes decidiu não pôr nada na cabeça, porque lhe aparecia lá sempre alguém em cima.» A ideia até foi boa, «mas um piloto confundiu a cabeça dele com uma pista de aterragem.»

Em Nicomedes, o careca, a coesão textual é assegurada por dois conjuntos de anáforas, recurso muito utilizado nas narrativas para a infância. Os problemas começam por «e apareceu-lhe», as soluções por «então». «Então pôs um pedaço de relva. E apareceu-lhe um futebolista em cima da cabeça. Então pôs serpentinas. E apareceu-lhe um casal que gostava muito de festas.»

Num momento de clímax, Nicomedes «então teve uma ideia» que «foi pôr uma espinha de sardinha em cima da cabeça». O pobre do Nicomedes colocou a espinha para afastar todo o tipo de pessoas. E conseguiu! Este foi o ponto de viragem que originou um desenlace feliz. Mas … e o gato? O gato saltou para a cabeça de Nicomedes que, inesperadamente, se viu com uma linda cabeleira. E mais: «às vezes, com a cauda pendurada atrás, Nicomedes ficava com um ar muito moderno, como se tivesse um rabo-de-cavalo.»
David Pintor e Carlos López, isto é, Pinto e Chinto, têm mais de 20 obras dedicadas à literatura infantil e são, atualmente, dos mais premiados e produtivos autores galegos.

Nicomedes, o careca foi lançado em junho de 2013. Com capa dura e feito com papel proveniente de fontes responsáveis, com a respetiva certificação pelo FSC (Forest Stewardship Council), é um livro para ser lido e sentido. As ilustrações cuidadas e repletas de humor, e um herói que não desiste perante as adversidades, também contribuem para o enriquecimento de leitores e ouvintes.