31 de julho de 2014

Túmulo no monte Cáucaso

Hoje o vento está mais frio. Apesar do céu azul, o vento está frio. Não sei especificar há quanto tempo estou parado aqui. A sombra das árvores cobre meu rosto, posso ver todo o jardim de entrada, a porta, a janela. Escuto certa movimentação dentro da casa, mas a porta permanece fechada. O vento está frio, mas o céu muito azul. Entre as folhas dos arbustos, à minha direita, vejo um pedaço da rua. Vazia. Posso observar um pedaço do meu carro, vermelho brilhante.

Sinto minha mão trêmula, acho que é o peso que ela sustenta. Não estou acostumado ao peso do metal. Não estou acostumado ao peso da situação. Sou apenas um homem. O céu está azul turquesa e eu tremo sobre o Cáucaso. Tremo como o homem que encara os olhos do diabo. Porém, hoje a mão que treme, a minha mão, será aquela que castiga, serei eu quem escreverá o epitáfio neste túmulo entre o mar Negro e o mar Cáspio.

Ouço vozes no interior da casa. O vento sopra mais forte e deita a folhagem que me esconde da rua. Posso ver meu carro, vermelho e brilhante. Sinto um pouco de tristeza quando penso nele queimado, a quilômetros daqui, mas é necessário. Vermelho e brilhante, por um momento sua cor vai escalar o ar em labaredas. É engraçado pensar nas chamas sobre o carro, no fogo em minha mão... É, sem dúvida, uma oferenda a Prometeu. A justiça dos homens sendo praticada sobre seu cárcere.

Ouço vozes no interior da casa. Penso nela. Imagino seu terror ao ouvir esta mesma voz. Imagino seu terror. Sinto náuseas quando a porta se abre.

Ele sai. Não me vê. Está vestindo um uniforme azul turquesa. O céu é azul turquesa. É seu dia. Minha mão treme. Endireito meu dedo junto ao metal e, quando ele passa por mim, tento sair devagar de entre as plantas, debaixo das árvores do jardim. Hoje o vento sopra mais gelado. Piso em um graveto e ele estala alto. Sinto náuseas. Tento ser silencioso, mas o homem se vira. Tremo. Encaro os olhos do diabo. Minha mão pesa. Ele me encara e pareço ter mil quilos na mão direita.

Sinto que sou reconhecido, já faz tempo, mas momentos como aqueles não se apagam “O que é isso? O que faz aqui!?” – olha minha mão – “Eu já fui inocentado, você...”. Hoje eu sou o castigo. Minha mão está apontada na altura de seus olhos. Cuspo fogo. Penso nela enquanto o vejo cair. Sua perna treme e sua camisa já não é azul turquesa. Penso nela e puxo o gatilho mais uma vez. E outra. E outra. Não é mais tão fácil identificar seu rosto, porém é mais fácil encará-lo. Sinto nojo. Penso nela. Venci o diabo. Não tenho medo, arranquei os olhos do mal. O vento sopra forte e as folhas das árvores cantam. Vejo meu carro e corro até ele. Obrigado,  Prometeu. Penso nela e sorrio.

por Luiz Fernando Pierotti